O GRANDE MESTRE TAO SIGULDA MORRE AOS 91 ANOS
Paulo Cheida Sans*
O artista plástico
Tao Sigulda morreu no dia 10 de fevereiro, vítima de insuficiência
renal, sendo sepultado no dia seguinte, em Campo Limpo Paulista. Ficou internado,
com problemas na vesícula, por 23 dias, no Hospital Pitangueiras,
em Jundiaí, SP.
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Tao escolheu Jarinu, SP, para fixar residência
há mais de três décadas. Deixa uma herança cultural
extremamente significativa, tanto pela sua produção artística
quanto pela fundação do Centro Cultural Tao Sigulda.
Tao Sigulda nasceu em Riga, Letônia,
em 1914, no início da I Grande Guerra Mundial. Viveu anos de sua
infância às margens do Rio Volga, na Rússia, nas propriedades
do pai, retornando a Riga em 1921. Aprendeu o ofício de técnico
em armas ao tempo em que iniciava seus estudos em arte.
Mais tarde, na Escola de Petersburgo, como
aluno de Roman Sutta, Tao fez suas primeiras obras abstratas. Mediante dedicação
aos estudos e visitas a exposições, o artista teve oportunidade
de aprimorar-se sempre e cada vez mais, e numa das visitas ao Salão
Internacional de Paris, em 1936, conheceu Picasso, amigo de seu professor.
Com perspicácia e talento criou tanto
obras dimensionais como tridimensionais. Tao Sigulda ganhou bolsa de estudos
para completar a sua formação artística na Alemanha.
Cursou a Escola Superior de Berlim e também estudou na Academia de
Belas Artes de Stuttgart, onde se destacou recebendo o título de
"Aluno-Mestre". Continuou seu estudo na Academia de Munique e
participou de cursos especiais nas Faculdades de Filosofia e Psicologia
da mesma cidade. Estudou anatomia com o célebre professor Molier
e esse aprendizado ficou registrado em suas obras de figuras humanas e de
animais.
Concluiu seus estudos na França, Itália
e Áustria. Nessa jornada conheceu importantes artistas e intelectuais,
como Fritz Hundertwasser e Willy Baumeister.
Vivendo na República Federal da Alemanha,
suas obras já faziam parte de importantes coleções
na Europa e nos Estados Unidos. Chegou ao Brasil em 1961, ficando fascinado
pela magia do país que reunia tantas raças! Ampliando o seu
conhecimento com o uso de materiais brasileiros, a "brasilidade"
aguçou a sua criação, passando a trabalhar ininterruptamente.
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Seu talento e conhecimento estão registrados
em diversas obras expostas em museus e salões de arte do mundo todo.
Vale registrar que os acessórios religiosos, esculturas e viltraux
do interior da Igreja do Preciosíssimo Sangue de Jesus, no Rio de
Janeiro, são obra sua.
Nos últimos anos, Tao realizou exposições
em Bremen, Stuttgart, Ulm, Viena e Nápoles. Nesta última cidade,
o crítico do Egostati Citá, Carlo Barbieri, destacou de modo
especial o artista, que recebeu premiações na Alemanha, Letônia
e Estados Unidos. Neste país, em 1967, recebeu o 1º e 2º
lugares na coletiva de Saginaw-Fair, de Detroid e o "Grande Selo do
Estado de Michigan". Obras de sua autoria estão espalhadas em
importantes acervos de vários países, entre os quais citam-se
países da África, a Alemanha, a Áustria, a Bélgica,
o Brasil, o Canadá, os Estados Unidos, a Inglaterra, a Itália,
a Suíça, Portugal, Trinidad e a Rússia. A partir de
1973, o artista realizou exposições individuais no Brasil,
Alemanha, Colômbia e Espanha.
Tao fundou o Centro Cultural Tao Sigulda em
Figueira Branca, ajudado por Tama, eficiente esposa, a qual possui extenso
currículo como atriz, tendo se apresentado em turnée em palcos
na Europa e também no Brasil e atuado no Teatro, Cinema e Rádio
João Caetano, na Aliança Francesa, na Pró-Arte e no
Instituto Goëthe, em São Paulo. Sua sensibilidade artística
tornou-a promotora cultural.
O Centro Cultural é hoje uma atração
turística e cultural em razão de sua dinâmica ao oferecer
mostras permanentes, além de outras atividades. O Centro Cultural
Tao Sigulda incentiva o intercâmbio entre artistas e apreciadores
da arte, por meio de cursos, eventos diversos de artes cênicas e mostras
coletivas que acontecem em duas ocasiões no decorrer do ano, reunindo
nomes consagrados com promissores artistas jovens, dentre os quais, vários
foram revelados para o mundo artístico e hoje integram importantes
mostras no Brasil e exterior.
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Entre outros, participaram de suas habituais
coletivas os seguintes artistas: A. Vilhena, Alex Roch, Celina Carvalho,
Elvio Santiago, Evandro Carlos Jardim, Gersey Pinheiros Cruz, Gisela Schmidt,
H. Bandeira, H. Strongov, Kaneko, Klaus Rybski, Lairana, Lúcia Rosa,
Márcio Schiaz, Marcos Guimarães, M. Domenica Perino, M.L.M.
Panizza, Marico Kaneko, Maurício Moraes, M. Helena, Orlando Marques
de Freitas, Paco Di Ribes, Paulo Cheida Sans, Semiramis R. Mojola, Signe
Moebus, Simone A.K. Neves, Tomie Ohtake e Young Koh.
O Centro Cultural também promove apresentações
de música, danças folclóricas e é um local destinado
aos apreciadores da arte que podem assistir aos eventos e relacionar-se
com pessoas especiais, freqüentadoras habituais do local. Excursões
acontecem de vários pontos da região para conhecer o Centro,
o qual hoje, com mais de vinte anos de existência, é, sem dúvida,
um patrimônio não só local, mas do país.
Na qualidade de artista, Tão Sigulda
trabalhou com materiais diversificados, demonstrando um talento inegável,
tendo passado por várias fases em sua carreira. O teor de sua criação,
no entanto oferece um estilo inconfundível tanto como escultor quanto
como pintor e desenhista. A atmosfera, que envolve suas personagens, e os
movimentos precisos de suas figuras escultóricas criaram um estilo
pessoal. Cada obra de Tao contém um teor simbólico e cada
elemento nela inserido está em sincronia com os demais. O artista,
de tendência surrealista, propõe que "tudo" tem significado.
Cada pormenor, por mais insignificante que possa parecer, nunca está
ao acaso em sua obra.
Numa ocasião pude observar Tao pintando.
Percebi nitidamente a "missão" de vida que o destino lhe
reservou: ser artista. Um artista, todavia, em sintonia com "algo"
superior, pois a sua obra representa "a imagem" como filosofia.
A visão de mundo apresentada em forma onírica revela, de modo
mais consistente, a própria natureza terrena e espiritual. A rica
produção do artista, tanto em qualidade como em quantidade,
já contava, em 1988, com mais de 6500 obras. A sua arte e o seu pensamento
de artista merecem um estudo aprofundado, para que seu nome seja resguardado
e perpetuado como expressão legítima de nossa cultura.
A experiência de vida de Tao, enriquecida
pela presença de Tama, determinou uma visão particular de
atuação, e somente quem acredita ser a arte importante como
conquista da sociedade, poderia propor a criação de um órgão
para a expansão artística, como, de fato, está sendo
o Centro Cultural Tao Sigulda.
Tao e Tama, o casal que transpirou "arte",
fez a sua história, enriquecendo a nossa. Certamente, Tao Sigulda
merece ser reconhecido e lembrado na história da arte por críticos
e pesquisadores para que sua obra seja cada vez mais perpetuada.
Quando completou 91 anos foram lançados
dois livros sobre ele - "Tao Sigulda - a arte é a caligrafia
da alma", de Heloisa de Aquino Azevedo e "Arte, educação
e projetos - Tao Sigulda para crianças e educadores", de Margaret
Brandini Park e Suely Iório pela Árvore do Saber Edições
e Centro de Estudos Pedagógicos. São estudos significativos
que registram a arte filosófica de um autêntico e versátil
artista que soube em vida compartilhar o seu conhecimento e amizade.
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*Curador do Acervo Olho Latino
Professor da Faculdade de Artes Visuais - CLC - PUC-Campinas.
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