ALAMANDRADE
(Salvador - Bahia)
Entrevistado por Jiddu Saldanha
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O Antenadíssimo
artista bahiano, Almandrade*, é uma das figuras que mais intriga o
cenário artístico brasileiro! Tanto no campo da criação
visual quanto no universo da poesia, ele confessa, nesta entrevista, que nasceu
para a concisão e o experimentalismo. Fruto de sua curiosidade ímpar
e um irresistível talento para experimentar linguagens!
LE - O absurdo /ronda /um céu de metáforas /sombra imóvel
/empoeirada /namora /o ar dos/museus /palavras desertas /soltas /no colorido
/dos jardins de Monet.(Almandrade) Há um flagrante neste poema, referência
a Monet, a palavra "museu" no plural, só resta perguntar,
quem nasceu primeiro, o poeta ou o artista visual Almandrade?
Alm - Os dois chegaram quase que ao mesmo tempo na minha vida. Comecei me
interessando pela poesia, logo depois descobrir as artes plásticas,
abandonei a poesia por um tempo. Hoje vivo entre as artes visuais e a poesia
e uma influencia a outra. Existe algo de comum entre a arte que faço
e a minha poesia, a busca da síntese, do mínimo. Uma economia
de elementos e de dados que configura uma opção estética
que venho perseguindo desde o começo de minha experiência com
a arte e a poesia.
LE - Esta busca pelo "mínimo" parte de onde? Há
um posicionamento contra alguma coisa? O Bispo do Rosário queria "reorganizar"
o mundo. E Almandrade, o que pretende?
Alm - Depois de passar pelo concretismo, poema/processo e arte conceitual
nos anos 70, o meu trabalho vem se encaminhando cada vez mais na busca da
leveza, de uma linguagem singular, limpa, com um vocabulário gráfico
sintético. No sentido não de organizar o mundo, mas de construir
um mundo com o mínimo. "Cabe sempre ao artista fazer de muitas
coisas uma só, e da menor parte de cada coisa criar um mundo".
(Rilke)
As minhas pinturas e esculturas são pensadas e executadas dentro de
um mesmo princípio. A realização de uma única
coisa ou criar com o mínimo um mundo.
LE - Seu currículo como artista visual é de tirar o chapéu,
coisas como Bienal de São Paulo, mais de uma vez, Salão Bahiano,
mostras nos principais espaços culturais do país. Deu para refrescar
a alma?
Alm - O trabalho do artista é um trabalho interminável, é
sempre bom participar de mais uma mostra, circular as idéias. A tarefa
do artista não é só produzir mas também fazer
circular sua produção, tarefa cada vez mais difícil,
hoje em dia, por que o artista está cada vez mais distante nas decisões
do circuito de arte.
LE - Estando cada vez mais distante das decisões importantes, o
artista corre o risco de ter de se reinventar? Hércules teria forças
para abrir o estreito de Gibraltar hoje?
Alm - O problema principal não é o artista, a meu ver, e sim
a obra, a arte enquanto produto de um conhecimento específico deixa
de existir, a reflexão cessa, a arte deixa de ser saber e passa a ser
acessório de um lazer cultural. O artista nada pode fazer. Nestas condições
desenvolver um trabalho já é um desafio.
LE - Me ocorreu te perguntar sobre o espírito das bienais hoje.
Você está plenamente de acordo? Acha que a crítica vem
acompanhando, de fato, o processo de desenvolvimento artístico do país?
Alm - As bienais como mostras de artes plásticas não tem muita
importância na atualidade. Elas estão mais ligadas ao entretenimento,
são decididas por profissionais de outras áreas, como os empresários
que não têm uma familiaridade com a linguagem das artes. Isso
é lamentável. A chamada arte, veiculada nestas mostras perdeu
a curiosidade. A crítica por sua vez, foi substituída pela curadoria.
Não há mais crítica de arte como nos anos 70, por exemplo.
LE - Alguns artistas bateriam palmas ao ouvir esta tua afirmação
de que "não existe mais crítica de arte". Você
acha que a crítica abriu espaço para este contexto atual ou
"fomos todos enganados pelo capitalismo"?
Alm - O compromisso do capitalismo é com o lucro, não é
com a produção de significados nem com a ética. No que
diz respeito à arte, obra passou a ser secundária. E quem decide
é o curador, o marchand, o cronista social ou o produtor cultural.
A hegemonia do mercado foi acompanhada do aparecimento do curador em lugar
do crítico, do produtor cultural e depois as leis de incentivo a cultura.
O objeto deslocado do contexto de origem, por determinação de
um artista, é sustentado pela "teoria" imaginária
de um curador.
LE - Fale um pouco da Revista Semiótica, de 1974. Quais foram os
frutos do Grupo de Estudos de Linguagem da Bahia, havia o interesse de criar
um paralelo para o cinema novo, por exemplo?
Alm - A revista Semiótica foi uma experiência nossa no começo
dos anos 70, sem grandes repercussões, éramos estudantes, eu
mesmo cursava o segundo ano de arquitetura. Foi sem dúvida, o primeiro
trabalho sobre semiótica realizado em Salvador e estávamos mais
vinculados com a poesia visual, muito pouco divulgada na Bahia.
LE - A Bahia parecia plena na década de 70, era o auge da Ditadura
mas os Baianos se destacavam na música, no cinema e na literatura.
Haviam pegadas a se seguir nas artes plásticas?
Alm - A Bahia sempre se manteve defasada com relação às
artes plásticas. No território das artes plásticas brasileiras,
a Bahia passou por um processo de amadurecimento meio lento para absorver
as linguagens modernas e promover uma renovação capaz de competir
com a arte produzida nos grandes centros, o que marcava a produção
baiana era uma tendência à regionalização e uma
recusa à universalidade, a busca de um "moderno regional".
A adaptação às novidades modernas se deu de forma aleatória,
dentro de um pacto com a temática local, nordestina. A contemporaneidade
custou a chegar, e acabou sendo diluída sem se assimilar direito suas
questões, como uma moda fácil que vem dominando a arte brasileira.
Uma arte contemporânea sem história, instantânea e descartável.
A exposição "O Sacrifício do Sentido", realizada
por mim em 1980, foi a primeira exposição individual de arte
contemporânea, do Museu de Arte Moderna da Bahia.
LE - Atualmente, no entanto, o Salão da Bahia tem tido um bom destaque
nacionalmente. Há outros salões de destaque para a arte contemporânea
na Bahia?
Alm - Sem dúvida, o Salão da Bahia tem destaque nacional e é
o único na Bahia. Quanto a "arte contemporânea" , ultimamente
não vejo com bons olhos. A arte contemporânea, recalcada nos
anos 70, ficou na moda, faz parte do cotidiano dos atuais salões de
arte. O belo é, para os novos especialistas da arte, a negação
do pensamento, uma brincadeira da sociedade do espetáculo. A arte foi
confinada a um campo restrito de experimentação, que tem como
referência a tradição da facilidade.
LE - Quem são os artistas que você faz questão de citar
nesta entrevista, ao longo da tua carreira como artista visual?
Alm - É sempre complicado citar nomes, não tenho essa habilidade,
acabo sempre esquecendo um... Gosto de artistas como: Hélio Oiticica,
Amílcar de Castro, Ligia Clarck, Franz Weissman, Wlademir Dias-Pino,
Iberê Camargo, Sergio Camargo, Milton da Costa...
LE - O que você lê?
Alm - Gosto de ler Filosofia, literatura, poesia, ensaio sobre arte, arquitetura...
Tenho alguns autores que marcaram a minha formação, como: Bataille,
Barthes, Lautrèamont, Foucault, Bachelard, Ítalo Calvino, Wittgenstein,
Walter Benjamin , Merleau-Ponty...
LE - Quem é Almandrade por Almandrade?
Alm - A fala do artista como qualquer fala, não fala do trabalho de
arte, insinua um modesto conhecimento que pode apenas facilitar o relacionamento
do espectador com a obra. É possível se falar de inúmeros
pontos de vista, mas o mais importante é se defrontar com a obra, só
o olhar pode tocar na sua "essência".
LE - O que você gostaria de dizer aos leitores do blogue "La
Estrada"?
Alm - Uma obra encerra múltiplas possibilidades de indagação.
Recriamos as imagens em nossa percepção, e as modificamos subjetivamente
de acordo com nossa experiência de vida. Projetamos sobre elas os nossos
valores e nossas inquietações. As obras de arte se completam
de formas diferentes na imaginação de cada espectador.
UMA PINTURA
O paraíso
contorna o olhar
do pintor.
Sede de ver
natureza morta
sem asas.
Meditações
de um pincel
que disseca
a beleza
Links
http://www.provadoartista.com.br/almandrade.html
http://www.imperios.com/monse/escultor/almandrade/almandrade.htm
http://www.expoart.com.br/almandrade
http://www.directory.com.br/almandrade
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* Almandrade - Artista plástico, arquiteto, mestre em desenho urbano e poeta.
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